quarta-feira, agosto 13, 2008

Currency Crisis - Modelos de 3 Gerações de Crises Monetárias.

Krugman define crises monetárias em termos da falta de confiança dos investidores sobre a moeda. Na tentativa de entender e explicar tais fenômenos foram desenvolvidos, ao longo do tempo, modelos de três gerações: Modelo Canônico (Primeira Geração), Modelos de Segunda-Geração e Modelos de Terceira Geração (crises auto-realizadas,contágio, grandes agentes, herd behavior).
O Modelo Canônico tem sua origem com Salant (1970), em que havia uma preocupação com a estabilização via agências internacionais, dos preços das commoditties, o que levava a uma especulação devastadora. Tal modelo foi posteriormente aperfeiçoado por Krugman (1979) e Garber (1980). O fundamental nessas abordagens era que as crises cambiais em uma economia com perfeita mobilidade de capitais eram resultado de inconsistências entre as políticas domésticas (déficits orçamentários financiados por imposto inflacionário) e a tentativa de manutenção de uma taxa de câmbio fixa, uma vez que o governo possui um estoque limitado de reservas para manter o câmbio.
A tentativa de financiamento da dívida pública via criação de uma base monetária leva a elevação do “shadow-price” (entendido como o preço esperado pelos agentes) da divisa doméstica, que por sua vez, gerava uma redução progressiva das reservas internacionais. De maneira geral, quando este é mais elevado do que a taxa de câmbio, esperam-se ataques especulativos. É importante ressaltar, no entanto, que a origem da crise externa advém do desequilíbrio do setor público que, ao monetizar um déficit fiscal permanente, produz ondas de ataques especulativos (entendidos como: fuga de capitais + desvalorização do câmbio + crise do balanço de pagamentos, Saldo em Transações Correntes.). Assim sendo, neste modelo, os Bancos Centrais têm um papel totalmente passivo e mecanizado pois apenas intervém no mercado para defender a taxa de câmbio. Fundamental nesse modelo é que a deterioração dos fundamentos macroeconômicos é condição necessária e suficiente para a ocorrência dos ataques especulativos.
O marco inicial dos modelos de 2ª Geração é Obstfeld (1990). Os Modelos descrevem um trade-off (defender ou não a taxa de câmbio) do governo que consiste entre flexibilidade macroeconômica de curto prazo e credibilidade da política econômica em longo prazo. Decidem se priorizam o controle da inflação ou uma menor taxa de desemprego. Esses modelos trazem uma sensação de “inevitabilidade” das crises pelas afirmações sobre a presença de “sunspots” (eventos circunstanciais que podem alterar o regime de câmbio), independentemente da solidez dos fundamentos macroeconômicos e do consenso comportamental dos players do mercado. Nesse sentido, a mudança do regime cambial assume forma de profecia auto-realizável, uma vez que a deterioração dos fundamentos macro é condição necessária mas não suficiente para a ocorrência de ataques especulativos (a condição suficiente é a existência de “sunspots”). Defender a paridade do câmbio pode ser muito dispendioso, o que leva a um aumento da taxa de juros elevada. Os especuladores tentam antecipar-se à desvalorização, conduzindo a economia para uma desvalorização antes que os fundamentos macro realmente forcem a deterioração do câmbio, que leva ao colapso da moeda.
Nos Modelos de 3ª Geração de Calvo (1996) e Krugman (1998), a crise cambial é parte integrante de uma crise geral da economia sendo pré-anunciada por crises financeiras. A crise externa está relacionada a ação do setor bancário e instituições financeiras em um contexto de desregulamentação do sistema financeiro (cessão desenfreada de crédito e alavancagem do setor privado financeiro e não-financeiro em tomar recursos do mercado para compor seus portfólios coberto pela ação do BACEN) e garantias para os empréstimos concedidos ao setor privado (criando um moral hazard gerado pelo BACEN). A crise se dá a partir de uma crescente fragilidade do sistema bancário resultante da deterioração dos créditos, levando a ataques especulativos. O aumento da oferta de moeda valida a corrida especulativa contra a moeda doméstica, levando ao pânico financeiro e a consequente perda de reservas internacionais. A crise cambial é definida como consequência de uma profecia auto-realizada, causada por um pessimismo que se confirma e por políticas econômicas inconsistentes com a manutenção do câmbio fixo, em longo prazo. Problemas de fundamentos macro (nível de reservas/situação fiscal do governo/fragilidade financeira) podem levar a um ataque especulativo. Nesse sentido entendemos o contágio como uma brusca deflação de ativos em um determinado mercado provocando a venda de ativos em outra praça financeira para compensar perdas de portfólio dos mega investidores. Isso só é possível devido à alta mobilidade de capitais, com o aumento das transações especulativas em moeda estrangeira. Os fluxos de capital podem ter uma ação disruptiva sobre países e setores canônicos, além de comprometer a autonomia das políticas macrodomésticas. Esse é o “Dilema da Globalização Financeira”: enquanto amplia oportunidades de financiamento e investimento com a diversificação dos instrumentos financeiros (securitização e derivativos), pode gerar efeitos econômicos adversos (extrema volatilidade do câmbio – entrada e saída muito rápida de capitais) que podem levar ao colapso das decisões de investimento. Nesse modelo os ataques especulativos são resultado das ações dos global players que utilizam grande quantia de recursos para adquirir opções e futuros de câmbio a uma taxa central mais baixa do que esperam para um futuro próximo. Tais “ataques” podem começar assim que os especuladores acreditem que o governo não seja capaz de dar suporte à demanda total de convers~ao de ativos em moeda estrangeira. (taxa de câmbio+expectativa de desvalorização/valorização cambial).
Os processos especulativos se dão quando ativos financeiros sub-valorizados sofrem um choque de demanda, levando a uma espiral altista de preços (inflação de ativos) que tende a se realimentar, valorizando a moeda doméstica. A ruptura do processo se dá quando uma deflação de preços leva a um colapso. Os BC’s então elevam a taxa de juros e/ou queimam reservas, levando a um rearranjo de portfólios globais.
Nos estudos de caso, Krugman coloca que no caso Europeu, o Modelo Canônico não poderia ser utilizado, uma vez que não havia necessidade de financiamento da dívida pública via monetização. A causa da crise foi o desemprego por demanda inadequada e a resultante pressão nas autoridades monetárias para exercerem políticas expansionistas. Essencialmente, a crise Européia se deu frente a um trade-off entre custos políticos do desemprego e os custos políticos de se sair da UME. Quatro aspectos devem ser ressaltados: 1) atuação de Geoge Soros; 2) Irrelevância de reservas cambiais; 3) Crise praticamente não antecipada pelo mercado; 4) Países que abandonaram a paridade se deram melhor do que os que se mantiveram apegados à esta.
Já na Crise Latino Americana, principalmente no México e Argentina, existiam problemas de fundamentos econômicos e, no caso do México principalmente, surgiu de eventos não esperados (sunspots – Rebelião e assassinato de candidato à presidência). Em comparação com a crise Européia, tinham pontos de contato em que a quebra dos mercados financeiros anteciparam as crises e a maior diferença é o pós-crise, muito mais profunda nas Américas, pior ainda para a Argentina que não teve um massivo pacote de ajuda dos EUA.
Na Crise Asiática também contava-se com inconsistências nos fundamentos econômicos. Desenvolveu-se uma preocupação sobre fraquezas financeiras devido aos investimentos que eram feitos a partir de empréstimos “mal informados”. A confiança dos investidores nos governos da região não era completa. A Crise Asiática demonstrou como todas as economias são interligadas e que o perigo do contágio é realmente algo preocupante.
As formas de prevenção de crises são duas: Ou uma união monetária nos moldes europeus, ou o livre cambismo, que parece ter sido mais adotado. O câmbio livre previne crises especulativas, mas não desvalorizações e crises monetárias.

Construção, Crise e Retomada da Hegemonia Norte-Americana

A construção da hegemonia Norte-Americana pode ser pautada sobre alguns pilares políticos e econômicos. Desde o fim da I Guerra Mundial, havia um vácuo de poder no que tange a uma unidade política organizadora do sistema internacional, não havendo nenhuma unidade disposta e capacitada para assumir tal posição. Como ressaltado por Arrighi, a França e, de certa forma, a Alemanha, almejavam a posição mas não possuiam as condições necessárias para assumí-la. Por sua vez, os EUA não tinham a ambição e nem a vontade política de se coloca nessa posição, mantendo sua postura pseudoisolacionista do outro lado do Atlântico. No entanto, persistia a necessidade de uma potência hegemônica dominante capaz de conciliar as políticas econômicas domésticas dos países soberanos com uma ordem monetária internacional.
Com os rumos da II Guerra Mundial já praticamente delineados e com o engrandecimento da ameaça comunista, os EUA assumem uma postura organizadora do sistema. Com a criação de Bretton Woods, instaura-se o padrão ouro-dólar em substituição ao padrão-ouro vigente no período anterior. Dessa forma, evitaría-se a volatilidade cambial, buscando-se a liberalização do comércio, estabilidade monetária e interdependência econômica global, o que traria mais eficiência e estabilidade ao sistema. Além disso, seriam criadas instituições financeiras como o FMI, Banco Mundial e o acordo do GATT que permitiriam uma gestão racionalizada e com divisão dos custos (tanto econômicos quanto políticos).
O compromisso das economias com o Embbeded Liberalism, de John Ruggie, demonstra a influência de cunho ideológico que permeia o cenário internacional. Havia o compromisso com o liberalismo, mas com uma política macro-econômica expansionista, em que o aumento dos gastos do governo geraria um efeito multiplicador nas economias. Caso o livre mercado agisse realmente sozinho, poderia-se não chegar aos objetivos preestabelecidos, uma vez que os mercados estavam com problemas crônicos de capitais produtivos e mão-de-obra. O Estado tinha, agora, um novo papel no liberalismo. Havia ainda o medo do retorno do nacionalismo destrutivo (fascismo/nazismo), desenvolvidos em oposição ao liberalismo tradicional, que deveriam ser evitados. A Doutrina Truman surge como um marco na formação hegemônica dos EUA, uma vez que simboliza a tomada do papel de administrador do sistema. Estariam dispostos a lançar ajuda a qualquer país para evitar a ameaça soviética.
A hegemonia Norte-Americana constrói-se sob a forma institucional, racionalizada, interdependente, com custos divididos e sob a ideologia do Embbeded Liberalism. É a tentativa de criar uma nova ordem mundial estável, em oposição aos fatores que levaram ao nacionalismo destrutivo e ao socialismo. Desta forma, busca resgatar e assimilar as economias destruídas e, inclusive, algumas economias menores.
Esse conjunto de fatos determinou a época de ouro do capitalismo, vivido até o fim dos anos 60 e início dos anos 70. Tal prosperidade foi proporcionada pela liderança internacional dos EUA e o compromisso de todas as economias com o Embbeded Liberalism. No entanto, os privilégios econômicos e políticos dos EUA, como emissor da moeda base do sistema, preocupavam os demais países. Não havia necessidade de se preocupar com os déficits americanos na condução de suas políticas, uma ve que os outros Estados acabariam imbutindo e financiando seu déficit na balança de pagamentos. No entanto, também não havia a possibilidade de desvalorizar o dólar frente as outras moedas, que automaticamente também seriam desvalorizadas. Havia um excesso de liquidez no mundo acompanhado de uma perda de reservas, uma vez que Alemanha e Japão exportavam muito mas com proteção. Ocorria o Dilema de Triffin, uma contradição entre liquidez e a confiança internacional, que minou a confiança dos atores em relação aos EUA. Existiam mais dólares no exterior do que havia a quantidade lastreada de ouro, logo, havia a insegurança de que fosse gerada uma crise especulativa e uma corrida para a troca de dólares por ouro. O dilema rompe com o acordo de cavalheiros entre os EUA e os parceiros ao redor do mundo, rompe o alinhamento mundial com a política macro-econômica americana e sepulta o Embbeded Liberalism. A situação ainda foi deteriorada pelos acontecimentos históricos, como o acirramento da Guerra do Vietnã, em que os EUA exportavam sua inflação doméstica para todo o mundo. A “estagflação”, antes inconcebível, ajudou a sepultar o sistema. Inflação, antes, era inversa a estagnação/desemprego. No entanto, a “Euroesclerose” com seus efeitos inflacionários aliado a Crise do Petróleo em 1973 levou a um momento de recessão econômica acrescida de inflação, ou seja, o sistema monetário internacional encontrava-se no mais absoluto caos, o que força a mudanças.
A retomada da hegemonia Norte-Americana se dá em dois movimentos: Geopolítico e Geoeconômico. No primeiro podemos ressaltar a importância da “Política do Dólar Forte”, instaurada no governo Nixon pelo Paul Volcker, a partir do aumento do juros americano. Aliado a isso, temos a quebra do regime ouro-dólar e a legalização do regime de cambio flutuante e da livre conversibilidade, que significava uma maior autonomia doméstica para os Estados na condução de sua política doméstica. Uma revolução financeira é realizada, com o desenvolvimento de um novo sistema financeiro desregulamentado, com maior mobilidade de capitais e um aceleramento na circulação e volume destes, criando uma relação muito maior de interdependência das economias. Claro, surgem empecilhos à essa ordem, como o novo protecionismo, o regionalismo, etc. Por sua vez, o movimento Geopolítico é marcado pela detènte da Guerra Fria.
Ao meu ver, a “crise da hegemonia dos EUA” serviu para mostrar o quanto sua hegemonia é forte e distinta de qualquer outra. Quando pressionado e obrigado a tomar uma decisão entre sua estabilidade doméstica ou a liquidez internacional, os EUA claramente dão preferência ao seu âmbito doméstico. O dólar é americano e o problema é de todos. Mesmo com essa decisão, já no câmbio flutuante, o dólar continua sendo a moeda base do sistema. Ou seja, os EUA viram as costas para o mundo e, de certa forma, forçam todos a mudar a condução de suas políticas domésticas em função da sua. Todo o sistema muda em sua função e não os EUA mudam em função do sistema.

O Fundo Soberano Brasileiro - O Cofrinho do Ministro e o Debate Nacional


1. Introdução: O que é um “Fundo Soberano”?


O Fundo Soberano, também denominado Fundo de Riqueza Soberana (Sovereign Wealth Funds), é a reserva monetária internacional de um determinado Estado aplicada em investimentos de maior rentabilidade e, geralmente, maior risco. Normalmente, são criados pelos governos quando esses se vêem em uma situação confortável em relação às suas reservas internacionais, ou seja, quando o volume de suas reservas ultrapassa aquele admitido como suficiente e necessário para que seu país seja capaz de enfrentar eventuais emergências financeiras. Chama-se “fundo” porque se refere a um capital voltado para aplicação em investimentos, e “soberano”, pois o capital em questão é aquele detido por um determinado Estado.
Assim, um país utiliza suas reservas monetárias como uma ferramenta no controle de crises nacionais e internacionais, embora estas possam rapidamente “virar pó” em um contexto de crise monetária nacional. No entanto, é notável que com essas reservas, os países tem como reagir mais efetivamente a crises, na tentativa de evitar a total estagnação de suas economias. Nesse sentido, as reservas internacionais, isto é, reservas que um determinado país detém em forma de moeda estrangeira, tradicionalmente costumavam ser empregadas para a obtenção de ativos líquidos de baixo risco, bastante conservadores, e conseqüentemente, de baixa rentabilidade (normalmente Títulos do Tesouro Norte-Americano devido à segurança e liquidez que o ativo oferece[i]). Porém, o mercado financeiro internacional vem apresentando novos padrões de investimento por parte dos governos. A prática de desenvolver fundos soberanos está tomando espaço no cenário internacional, e usualmente é aplicada por países que são grandes exportadores de commodities energéticas (como por exemplo, a Noruega, exportadora de petróleo) ou por países que possuem grandes superávits comerciais e reservas excedentes, o que lhes permite correr mais riscos (como no caso chinês) na busca de um retorno mais lucrativo. Esse patrimônio em moeda estrangeira contido no Fundo Soberano é administrado pelos organismos estatais, que geralmente aplicam-no fora de seus respectivos países, sendo utilizados em projetos internacionais de interesse dos governos. Os recursos também são, por vezes, empregados no apoio à produção nacional[ii].
Enquanto os recursos ainda concentravam-se na obtenção de Títulos do Tesouro norte-americano, a atuação dos Fundos Soberanos pôde passar quase que despercebida no mercado financeiro internacional. Contudo, a situação mudou a partir do momento em que a atuação dos Fundos Soberanos de países estrangeiros começou a se voltar para a aquisição de grandes empresas e bancos em outros países, o que alarmou principalmente os países desenvolvidos. Dessa forma, o clima político em relação à atuação do Fundo Soberano tem ficado tenso, pois existe um grande receio de que esses fundos assumam posições dominantes ou até obtenham a posse total de empresas estratégicas e bancos, ameaçando o poder dos países nos quais esses setores estratégicos se localizam.[iii] O temor é que a atuação desses fundos fuja a lógica econômica e tome por objetivo o domínio de setores chaves da economia de um país por outro. Em grande medida, esse temor é ampliado devido ao fato de que os Fundos Soberanos não são regulamentados por nenhum tipo de organismo internacional capaz de controlar suas atuações. Não há nem mesmo a obrigação de que esses fundos emitam qualquer tipo de relatório sobre suas operações. Por isso, países mais industrializados (G7, por exemplo) pressionam internacionalmente pelo estabelecimento de um código de boas práticas para estes fundos, com o objetivo de promover "transparência e previsibilidade" em suas atuações no mundo financeiro, diante das conseqüências potenciais que poderão ter sobre os mercados financeiros e os investimentos.[iv]

2. O Fundo Soberano Brasileiro e os Argumentos Pró sua Criação


Nos últimos 30 anos, o mundo tem passado por um intenso processo de globalização financeira. Esse processo ancorado no dólar dos EUA veio acompanhado de grandes crises cambiais que afetaram muitos países, levando ao seu endividamento externo. Contudo, principalmente nos últimos cinco anos, favorecidos pela excessiva liquidez internacional, seguida do crescimento da economia mundial que serviu de estímulo à elevação da demanda e dos preços internacionais, os países que haviam sido fortemente afetados pelas crises conseguiram finalmente livrarem-se da situação de sufoco cambial crônico, na qual agonizavam desde a década de 1980. Esse novo contexto possibilitou que tais países quitassem a maior parte de seus compromissos com organismo internacionais, como o FMI, e que, até mesmo, acumulassem um volume recorde de reservas internacionais.
A acumulação de reservas pode ser vista como uma ferramenta fundamental , principalmente para países como o Brasil, que já amargaram profundamente com crises cambiais no passado, no controle da economia doméstica, especialmente em tempos de crises monetárias devidas à alta mobilidade e volatilidade dos fluxos de capitais. Assim como outros países que já estiveram nesta situação, o Brasil passou a acumular, nos últimos anos, grandes reservas em uma velocidade recorde na história do país. Tradicionalmente os Fundos Soberanos foram instituídos por países que se caracterizam como grandes exportadores de petróleo, no entanto, atualmente, essa prática se estendeu também aos países em desenvolvimento, devido ao incremento inédito de suas acumulações de reservas internacionais e superávits primários constantes.
No Brasil, o alívio em relação à melhor situação da dívida externa e esse elevado volume de reservas em moedas estrangeiras acumulado pelo país nos últimos anos tem dado estímulos à criação de um Fundo Soberano Brasileiro.[v] Nesse contexto, o Brasil, como a oitava maior reserva internacional do mundodiscute se o atual momento seria apropriado para a criação do Fundo Soberano Brasileiro (FSB).
Neste debate, encontram-se de um lado, aqueles que são a favor da criação do FSB, dentre eles o atual Ministro da Fazenda, Guido Mantega, que afirmam a posição do Brasil como credor no mercado internacional, e que o forte e crescente fluxo de entrada de recursos externos e a elevação do país a grau de investimento proporcionam o momento propício para o estabelecimento do Fundo.[vi] Segundo eles, desta forma, estancaria-se a perda que ocorre devido à baixa rentabilidade dos recursos brasileiros, numa referência às reservas já mantidas pelo Banco Central, já que a maior parte está aplicada em Títulos do Tesouro Norte-Americano.[vii]
O FSB já anunciado pelo governo cumpriria a função de realizar investimentos no exterior para apoiar projetos de interesse estratégico e ampliar a rentabilidade dos ativos financeiros mantidos pelo setor público. Para tanto, o fundo iria capitalizar o BNDES no exterior, possibilitando que o banco financie empresas brasileiras e seus projetos no exterior, servindo também para a internacionalização das empresas nacionais. Outro benefício trazido pelo FSE seria a utilização do mesmo como instrumento de contenção dos gastos públicos, visto que os recursos não seriam aplicados em território nacional. Além disso, muito relevante para o cenário atual, o Fundo teria o papel de enxugar a liquidez de dólares no mercado interno, contendo a valorização do Real e, ainda, permitindo uma poupança fiscal para conter a alta da inflação. Reforçando o argumento, o Ministro da Fazenda afirmou que a fonte dos recursos que irão para o FSB será uma parcela do que exceder a meta de superávit primário.[viii] Seria uma “economia adicional de 0,5% do PIB, correspondente a 13 bilhões de reais. Segundo a explicação de Mantega,
“As reservas, por sua própria natureza - porque elas têm que dar cobertura cambial ao país - têm de ser aplicadas de forma conservadora - como o são. E, portanto, o rendimento delas costuma ser menor. Porém, o que estamos falando é de um excedente para além das reservas. As reservas continuarão e nós teremos um excedente, que será aplicado de forma mais rentável.”[ix]
Em defesa do Fundo, também é argumentado que o mesmo aplicará o excedente dessas reservas nacionais com a finalidade de estabelecer uma poupança interna para momentos de crise de arrecadação, como um mecanismo anticíclico.
Para a maior parte de seus defensores, em suma a criação do Fundo seria oportuna para dar auxílio na contenção da queda do dólar e permitir avanços no setor produtivo, além de ser uma forma de melhorar a rentabilidade de nosso superávit. Dessa forma, alguns atacam os opositores do FSB como neoliberais que querem partir para a destruição da indústria nacional, já que são contra o Fundo que proveria investimentos vitais para seu crescimento.
Preocupado com a questão da tensão política que a atuação do Fundo pode causar, o Ministério da Fazenda estabeleceu que semestralmente será encaminhado um relatório ao congresso a fim de garantir a transparência das operações do FSB. Nesse sentido, o governo também se preocupou em estabelecer um limite máximo de recursos destinados ao FSB, por meio de um decreto de regulamentação do Fundo.

3. O Fundo Soberano Brasileiro e os Argumentos Contra sua Criação


Do lado dos críticos do FSB da maneira proposta pelo governo, encontra-se um grupo de peso, composto por Luiz Gonzaga Belluzzo, Delfim Neto, João Paulo dos Reis Velloso e Aloísio Mercadante. As críticas às ações do governo podem se concentrar na origem dos recursos, na interferência sobre o câmbio e sobre a gestão do fundo.
No que tange às origens do Fundo, a crítica entende que a receita fiscal vem surpreendendo favoravelmente a cada mês, no entanto, o aumento dos gastos governamentais em geral, mas especialmente com pessoal, vem preocupando até mesmo os integrantes da equipe do governo. Ou seja, a qualidade da política fiscal vem se deteriorando. Além disso, argumenta que o Fundo seria mais uma forma de se intervir ativamente sobre o câmbio, cumprindo a função que o BACEN é encarregado e vem realizando há algum tempo. O terceiro argumento compreende que as maiores empresas brasileiras já se internacionalizaram e não dependem dessa fonte de financiamento. O que ocorreria seria o fomento à empresas de médio porte com crescimento recente, as quais já recorrem ao BNDES. Alguns mais extremados chegam a afirmar que estas empresas deveriam trabalhar em regime de livre mercado, capitando seus recursos de forma autônoma e sem intervenções de instâncias superiores.
Para este grupo, os recursos do esforço fiscal adicional não deveriam ser usados neste momento para a compra de dólares, pois prejudicaria o combate à inflação e reduziria o impacto do anúncio de uma redução de gastos nas expectativas do mercado.
O ponto central é que o Brasil não é um exportador de capitais. Para aprofundar a produção de exportáveis industriais via fundo soberano, o Estado precisa tornar-se um poupador líquido. Senão, haverá a necessidade de alavancar o fundo, se endividando. No Brasil, devido à política fiscal “expansionista”, as poupanças domésticas são muito baixas, e como a aceleração do crescimento requer o crescimento dos investimentos, ela requer também a absorção de poupanças externas por meio de déficits persistentes nas contas correntes. Ou seja, a partir da uma análise da política fiscal brasileira, por mais que o superávit primário seja razoável, com o pagamento dos juros, o Brasil ainda incorre em déficits operacionais, que mantem a necessidade de financiamento do setor público (NFSP) positiva. Há quem diga que mesmo os superávits atuais, são temporários, decorrentes da crise de confiança de 2002. Nesse sentido, esses superávits permitiram uma redução da dívida externa, que aliada a acumulação de reservas e elevação de preços das comodities, levou ao ciclo de apreciação do real iniciado em 2003. A aceleração do crescimento requer investimentos maiores e, dada a poupança, o país voltará aos déficits nas contas correntes, explicitado pelos dados mais recentes. Desta forma, não faz sentido criar um Fundo Soberano em um país que não exporta capitais e cuja política fiscal é pró-cíclica, com aumento gastos públicos.

4. Conclusão


A saída encontrada pelo governo foi de postergar o uso do fundo para operar no mercado de câmbio, até porque necessitaria ser aprovado e regulamentado no Congresso. No entanto, o ajuste fiscal adicional será acompanhado do Fundo Soberano. Desta forma, governo e críticos estariam parcialmente satisfeitos.
No entanto, aqui defendemos uma posição crítica mais forte, já que devido às elevadas taxas de juros, o Brasil encontra-se em uma posição de déficit operacional, por mais que em uma posição de superávit primário. Nesse sentido, o Brasil é um país tomador de recursos e não exportador destes, demonstrando que não possui o perfil necessário para a criação de um Fundo Soberano. No Brasil não existe excedente. Caso este fosse criado, estaríamos tomando recursos emprestados para poder investí-los, criando um Fundo alavancado. É uma questão de custo de oportunidade, a qual fiscalmente tende em rejeição ao fundo, no entanto, este poderá ser uma boa ferramenta de controle econômico doméstico em longo prazo, caso se cumpram as condições explicitadas ao longo do trabalho.

5. Bibliografia

CARVALHO, Jiane – Ativos devem triplicar em dez anos. Gazeta Mercantil, São Paulo, 28.11.2007, p B-1.

GIAMBIAGI, F. Dezessete anos de política fiscal no Brasil: 1991-2007. Texto para Discussão Nº. 1309. Rio de Janeiro: IPEA, novembro de 2007.

MINISTÉRIO DA FAZENDA. “Fundo Soberano terá Caráter anticíclico”. Disponível em: http://www.fazenda.gov.br/audio/2008/maio/a130508.asp. Acesso em 13.06.08

ROMERO, Cristiano - O Fundo Soberano e seus temores. Valor Econômico, São Paulo, site: - http://www.andima.com.br/clipping/051007/index.html Acesso em 09.06.2008

SCHWARTSMAN, Alexandre – Uma parábola soberana. Folha de São Paulo, São Paulo, site: http://www.andima.com.br/clipping/281107/index.html Acesso em 13.06.08

FRANCO, Gustavo - O cofrinho do ministro. Folha de São Paulo, São Paulo, publicado em 17/5/2008

CRUZ, Valdo & D’AMORIM, Sheila – Lula busca direção fora da equipe econômica. Folha de São Paulo, São Paulo, publicado em 01/06/08

PASTORE, Affonso Celso & PINOTTI, Maria Cristina – O fundo soberano e a disciplina fiscal. Valor Econômico, São Paulo, publicado em 03/12/2007.


6. Referências

[i] Os Títulos dos EUA rendem apenas aproximadamente 4,5% ao ano.

[ii] Contudo, apesar de somente nos últimos anos a prática do Fundo Soberano estar entrando em evidência, a iniciativa não é algo tão recente. Os primeiros fundos soberanos surgiram na década de 50, criados pelos países exportadores de petróleo, dentre eles o Kwait (1953).

[iii] “Duas tentativas de compra de empresas americanas nos setores de petróleo e de pontos por parte de companhias estatais da China e dos Emirados Árabes Unidos fracassaram em 2005, levando o governo americano a aprovar, neste ano, uma nova “Lei de Investimento Estrangeiro e Segurança Nacional”. Ver ROMERO, Cristiano - O Fundo Soberano e seus temores. Valor Econômico, São Paulo, site: - http://www.andima.com.br/clipping/051007/index.html Acesso em 09.06.2008

[iv] Existe ainda o temor quanto à possibilidade de esses Fundos tornarem-se elementos de instabilidade do sistema, já que parece que a tendência ultimamente tem sido um forte protecionismo no mercado de capitais. Isso porque os fundos vêm se aproveitando da crise financeira nos EUA e investindo cada vez mais em bancos e no sistema financeiro em geral.
[v] “No final de 2000, as reservas internacionais do Brasil, no conceito de liquidez internacional, totalizavam pouco mais de US$ 33 bilhões em valores correntes e em dezembro de 2007 superavam a marca de US$ 180 bilhões. Já sua dívida externa total (pública +privada) acrescida dos empréstimos intercompanhia, que fechou o ano de 2000 avaliada em aproximadamente US$ 236 bilhões, em dezembro de 2007 girava em torno de US$ 244 bilhões. Assim, a relação reservas/dívida externa que era de aproximadamente 14% em dezembro de 2000 passou para quase 74% ao final de 2007, denotando uma grande melhoria na vulnerabilidade externa do País”. Ver CARVALHO, Jiane – Ativos devem triplicar em dez anos. Gazeta Mercantil, São Paulo, 28.11.2007, p B-1.


[vi] O ministro Guido Mantega declarou, ao anunciar o Fundo, que: “O governo já está fazendo um esforço fiscal e obtendo um superávit primário maior que a meta estabelecida. Teremos um excedente que será colocado nessa modalidade. É como um cofrinho”. Ver SCHWARTSMAN, Alexandre – Uma parábola soberana. Folha de São Paulo, São Paulo, site: http://www.andima.com.br/clipping/281107/index.html Acesso em 13.06.08

[vii] Cálculos afirmam que essa perda poderia chegar a R$ 100 bilhões em dois anos, considerando-se a perda de valor das reservas devido à valorização do real e ao fato de que a rentabilidade das reservas é menor que o custo da dívida interna, em conseqüência da compra de dólares.

[viii] Atualmente, a meta é de 3,8% do Produto Interno Bruto, isto é, da soma de bens e serviços produzidos no país.

[ix] Ver: MINISTÉRIO DA FAZENDA. “Fundo Soberano terá Caráter anticíclico”. Disponível em: http://www.fazenda.gov.br/audio/2008/maio/a130508.asp. Acesso em 13.06.08

O Dilema da Cartilha Neoliberal na África

É interessante notar que, como na maioria dos países periféricos do globo, a República Democrática do Congo foi obrigada a adotar a cartilha neoliberal do FMI, criticada por muitos por ser extremamente ortodoxa e defensora dos interesses das grandes multinacionais, notadamente as Norte-americanas. Nesse sentido, o projeto de orçamento de 2007, apresentado pelo governo à Assembleia Nacional, foi marcado por uma “orientação neoliberal estrita, conforme aos arranjos acordados com os serviços do FMI”, disse o ministro congolês das Finanças, Athanase Matenda Kyelu. Assim como afirmado anteriormente, é preciso que tenhamos em mente o FMI é entendido por alguns como o ponta de lança da globalização financeira, particularmente conhecida em todos os continentes junto às populações pobres devido devastações cometidas com as medidas anti-sociais que tem imposto há um quarto de século.

A Assembléia Nacional da República Democrática do Congo adotou emendas em 14/07/2007 que reviam o orçamento, o que não agradou o FMI. Por isso, o ministro das Finanças foi forçado a intervir: "o Conselho de Administração do FMI, que se reuniu segunda-feira 18 de Junho de 2007 para examinar o estado de avanço do programa de estabilização macroeconômicas acompanhado pelos serviços do FMI, exprimiu preocupações quanto à evolução do debate em curso no parlamento acerca do Projecto de Lei orçamental 2007 [...] as previsões das receitas e das despesas foram sensivelmente revista em alta, de modo que elas não correspondem mais ao quadro macroeconômico implícito na elaboração deste Orçamento 2007". Ou seja, governo foi forçado a intervir junto ao Senado, se submetendo ao FMI e aos seus credores.

Mas qual a importância deste orçamento? Em primeiro lugar, o total do orçamento é de cerca de 2,4 mil milhões de dólares, ou seja, a mesma quantia que Estados Unidos gastaram com a ocupação do Iraque em menos de duas semanas; ultrapassando por pouco as despesas anuais operacionais do FMI, que emprega apenas 2700 pessoas. Nesse sentido, motra-se impossível reconstruir um país devastado por duas guerras que fizeram 3,5 milhões de mortos. Para comparação, a França, cuja população ronda os 60 milhões de habitante tal como a República Democrática do Congo, tem um orçamento de 520 mil milhões de dólares, ou seja, mais de 200 vezes do orçamento congolês.

Além disso, 50% dos recursos próprios da República Democrática do Congo vai para o serviço da dívida, reduzindo a capacidade do governo para consagrar os seus recursos internos. Assim, o governo encontra-se perante um trade-off: realizar os investimentos prioritários ou reembolsar credores ricos que açambarcam as riquezas nacionais. Sendo fortemente aconselhado pelo FMI, escolheu a segunda alternativa.

A conclusão a que se chega é que as riquezas congolesas não beneficiam o Estado nem a população do país, mas a alguns próximos do poder e a empresas transnacionais a cujos interesses servem o FMI e as grandes potências. Evidentemente, as despesas com a educação e a saúde são reduzidas de modo proporcional. Este projeto de orçamento é visto por alguns como impedidor da satisfação das necessidades fundamentais da população camponesa violando vários textos fundamentais, quer seja a Declaração Universal dos Direitos Humanos ou o Preâmbulo da Constituição congolesa.

Contexto Regional:

No entanto, se formos analisar um contexto histórico regional, vemos que a independência africana, depois da Segunda Guerra Mundial, despertou grandes expectativas com relação aos seus novos governos de "libertação nacional". Em alguns casos, seus projetos de desenvolvimento foram muito bem-sucedidos durante os primeiros tempos de vida independente. Este desempenho inicial, no entanto, foi solapado por sucessivos golpes, regimes militares e pela crise econômica mundial da década de 1970. A crise mundial atingiu em cheio as economias periféricas, acabando por provocar um prolongado declínio da economia africana até o início do Século XXI. Ainda na década de 90, mesmo com o fim da Guerra Fria e com o auge da globalização financeira, o continente africano ficou praticamente à margem dos novos fluxos de comércio e de investimento globais.

Entretanto, no princípio do século XXI, a economia africana ressurgiu, acompanhando o novo ciclo de expansão da economia mundial. Esse movimento foi entendido por José Luis Fiori como um “momento em que o sistema mundial ingressa numa nova ‘corrida imperialista’ entre as suas ‘grandes potências’". Nesse sentido, estaríamos passando por uma terceira fase do Imperialismo. Mesmo que Fiori esteja correto, os ganhos africanos podem ser demonstrados com o crescimento médio, que era de 2,4% em 1990, passou para 4,5%, entre 2000 e 2005 e alcançou as taxas de 5,3% e 5,5%, em 2007 e 2008. Mais ainda, no caso de alguns países produtores de petróleo e outros minérios estratégicos, estas cifras alcançaram níveis ainda mais expressivos, como em Angola, Sudão e Mauritânia. Esta mudança da economia africana deve-se principalmente ao impacto do crescimento da China e da Índia. Hoje, esse dois países consomem 27% das exportações africanas, assim como a Europa e os Estados Unidos. Na direção inversa, as exportações asiáticas para a África vêm crescendo à uma taxa média de 18% a.a. junto com os investimentos diretos chineses e indianos, sobretudo em energia, minérios e infra-estrutura. A África é, hoje, o grande espaço de "acumulação primitiva" asiática e uma das principais fronteiras de expansão econômica e política da China e da Índia.

O desempenho econômico sólido na década de 1995-2005 em toda a África contrasta fortemente com o colapso econômico de 1975-1985 e com a estagnação que o continente viveu em 1985-95. É possível manter o crescimento, acelerando a produtividade e aumentando o investimento privado. No entanto, a melhoria da conjuntura e da infra-estrutura empresarial nos países africanos, assim como encorajar a inovação e aumentar as capacidades das instituições torna-se primordial.

O desempenho econômico em 2005 foi bastante irregular entre os diferentes países, passando de -2,2% no Zimbabué para 30,8% na Guiné Equatorial. O problema está em que grande parte desse crescimento é resultado das altas do preço do petróleo, já que na África existem grandes exportadores de petróleo e pela escassez de recursos, grande instabilidade, predisposição para conflitos, em países que foram afectados ou saíram recentemente de conflitos, simplesmente encontrados num crescimento lento inferior a 4%.

Segundo a análise do Banco Mundial em 14 de Novembro de 2007, seguindo a cartilha neoliberal, muitas economias africanas se recuperaram e poderão mesmo estar em via de um crescimento mais rápido e seguro, o que é necessário para reduzir os altos níveis de pobreza. As características comuns à todos os países africanos que registaram um crescimento continuado foram a maior integração à economia mundial, especialmente através do comércio para exportação, que explicam em os níveis agregados de eficiência e os volumes de investimento registados por esses países. O crescimento atual se deve às reformas aplicadas na última década, e a inflação, os défices orçamentais, as taxas de câmbio e os reembolsos da dívida são mais comportáveis; as economias são mais abertas ao comércio e às empresas privadas; melhor governabilidade, havendo uma luta mais intensa contra a corrupção. No entanto, a instabilidade do continente ainda modera as expectativas e os investimentos.

O principal fator para manter o crescimento e reduzir a instabilidade são as exportações. Portanto, é necessário baixar os custos de exportação (entre 18% e 35% dos custos totais), comparado com os custos indirectos na China – meramente 8% dos custos totais. Nesse sentido, as empresas africanas acabam perdendo competitividade no âmbito global, devido a custos indiretos mais elevados, o que inclui as infra-estruturas, um constrangimento emergente para o crescimento futuro.

Contexto doméstico:

A economia da República Democrática do Congo baseia-se na exploração de recursos minerais, sobretudo cobalto, cobre, diamantes, ouro e urânio, apesar do declínio experimentado pelo setor com os conflitos internos recentes. O país possui um grande potencial hidrelétrico, além de abundância de recursos madeireiros e agrícolas (café, cacau, dendê). Entre 1991 e 2001, a situação econômica deteriorou-se progressivamente, com índice negativo de crescimento anual médio do PIB – menos 6,7 %. Em 2002, registrou-se crescimento de 3%, em 2005, 6,5% e em 2006, 5,1%. No entanto, a desagregação da economia nos últimos anos tende a comprometer a confiabilidade dos dados macroeconômicos. Dessa forma, grande parte dos dados numéricos apresentados são meramente indicativos.

No ano 2000, a agricultura representava, 55% do PIB, uma grande evolução em relação aos 25% em 1985. Antes dominado por grandes multinacionais, dedicadas aos cultivos de cacau, café e dendê, o setor, agora, baseia-se cada vez mais na agricultura de subsistência. O setor industrial está decadente, havendo-se reduzido sua participação no PIB de 33%, em 1980, para 11% em 2000. Como resultado da falta de investimentos, escassez de divisas e baixa demanda, o que restou do parque industrial congolês opera com mais de 60% de capacidade ociosa.

Estima-se que aproximadamente 70% da força de trabalho estão desempregados, sobrevivendo graças ao setor informal da economia que, além da agricultura de subsistência, inclui toda uma gama de atividades nas áreas de comércio, transportes e serviços em geral. Em 2000, o setor de serviços teria respondido por 34% do PIB.

Registram-se alguns resultados positivos no tocante à taxa de inflação, que, de 659%, em 1996 e 515,8% em 2000, foi reduzida a 21,6% em 2005 e 13,1% em 2006 (segundo segundo dados do Banco Mundial, a República Democrática do Congoteria conseguido estabilizar sua economia de forma considerável).

Nessa análise do contexto econômico nacional, é impossível passar desapercebido pela retomada do diálogo com a comunidade financeira internacional, especialmente a partir da parcial pacificação do país em 2002. Doadores e instituições financeiras internacionais adotaram medidas favoráveis, entre as quais o desbloqueio de empréstimo de 454 milhões de dólares pelo Banco Mundial e a anulação de dívida de 4,64 bilhões de dólares por parte do Clube de Paris. A dívida externa da República Democrática do Congoseria da ordem de 11 bilhões de dólares, segundo dados de 2002. Tais fatos vão impactar diretamente no reequilíbrio e crescimento econômico.

No tocante ao intercâmbio comercial, as exportações teriam somado 1,4 bilhão de dólares, em 2002, contra importações de US$ 906 milhões. Os principais itens exportados compreendem diamantes, cobre, cobalto e café. As exportações destinam-se principalmente à Bélgica (64%), EUA (13%) e África (7,7%). Na pauta de importações sobressaem bens de consumo e de capital, alimentos e material de transporte, provenientes da África (42%), União Européia (41%) e Ásia (9,7%).

Assim, podemos ver que a “estabilização da guerra civil” e a adoção da cartilha neoliberal proposta pelo FMI trouxe avanços econômicos para diversos países, especialmente no Congo. No entanto, com estas medidas, o lado social fica negligenciado e continua pressionado. Gastos sociais não são o foco do FMI, o que complica a sua adoção no continente africano, repleto de conflitos étnicos, guerras civis e genocídios. No entanto, o crescimento econômico resultante dessas medidas restritivas pode ter um impacto positivo nas futuras ações sociais destes países. Atualmente ineficientes econômicamente, qualquer ação social com recursos governamentais mostra-se pouco eficaz ou completamente ineficiente, ao passo que a adoção das medidas neoliberais proporciona uma abertura econômica, seguida de aportes de investimentos estrangeiros, gerando um desenvolvimento de todo o país que passa a poder proporcionar benefícios sociais à população.


Bibliografia: